segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Manhã de outubro

Não sou um bom lugar. Um momento de indisposição, quando sinto que sem tempo estou. Os olhos quadrados, procuram a caligrafia perdida. Não há responsabilidade maior que enganar o próprio coração. Abandono a certeza, nem comento a indelicadeza. 
Volto para olhar o quarto vazio. 



quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Um dos lados


Não vejo o que não quero. Desisti de sair atrás de pistas, sabendo que a melhor delas sou eu. Poucas vezes escrevi, mas devo confessar, sentir é ainda melhor que expressar, ainda mais para alguém igual a eu, acostumada com o silêncio. Aprendi que quando estamos sós, inibimos até os fantasmas. Não diga que não tens medo, todo mundo passa em branco alguma vez na vida - o rascunho nunca passa sem tocar nas pernas.  

Abro a janela e ali está, tudo o que queria encontrar.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Cabeça de peixe


O som dos peixes descamados argumentava com a velocidade do seu querer. A média de consumidores era altamente pela época das férias escolares, justamente a que conheceu do outro lado do balcão. As filhas, uma de cada pai, formando o trio feminino em uma casa construída com tantos trabalhos extras nos domingos – desconfiavam da verdade. Descamar peixes é um absurdo, diante de tanta gente que nem obrigado fala.
A mais velha casou-se e foi morar em uma cidade distante do mar, da maresia apenas as lembranças da infância a as visitas até a mãe. Uma delas, esqueceu o seu nome em razão da loucura promovida pelo então seu esposo – insistente de tarefas e desacordos familiares. Eu chego cedo, ajudo na pesagem dos peixes. Quando posso, nego a identidade diante de tantos homens em alto mar - certa vez precisei usar a faca para condizer com o meu nome.
Hoje estou de folga e posso censurar todos os clientes de barriga cheia e acostumados com o litoral apenas nos seus descansos. Alguns acreditam, cabeça de peixe frita é uma delícia. 

domingo, 1 de julho de 2012

A felicidade não é um dever, mas falta do que fazer

Perdeu-se no que iria dizer. Não é tarde. Cedo os carros passavam. A cidade não dormia. Sirenes e gritos da porta da igreja. Dois pedintes, exigindo complemento para a passagem do ônibus. Surdos não estávamos, mas carentes de opinião, iguais aos ratos escondidos nas tampas dos bueiros sem ter o que falar quando percebem um belo par de pernas feminino. 
Televisão, notícias do final de semana. Tudo culpa do tempo, os mesmos horários, a mesma voz dos apresentadores, até os gols da rodada, previsibilidade de uma época igual, mesmo com insistências diferentes. 
O silêncio da rua. Nenhum bêbado para esbravejar contra o começo da semana, pouco do inverno, que tantas vezes maltrata - agora descansa, rotina não respeitada pelos populares. "O poema não diz, o que a coisa é, mas diz outra coisa, que a coisa quer ser" - o conto não é feliz, mas falta do que fazer. 

"Muitas Vozes", Ferreira Gullar. 

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Concordância



 Os peixes dormem.
 O peixe dorme.
 Não arrisca, muito menos deixa barato, corrigir o meu plural constante. 



Dois e dois - eu durmo, você dorme. Apague a luz. Somente me acorde após já ter escovado os dentes. 


Os peixes ainda dormem.





sábado, 31 de março de 2012

Discrição



Não ouvi nada. Quanto percebi, eles já estavam todos na cozinha. Sou péssimo em descrever pessoas, mesmo as conhecidas. A ideia surgiu na internet, segundo a minha filha. Problema é que hoje todos tem uma rede para conectar. 

— e o alarme da casa, senhor?

Ainda não disse? Hora do planeta. Pode isso, delegado?

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Prova final




Chegamos cedo em casa. Depois de horas na estrada, sacudindo diante dos buracos fechados superficialmente em reformas eleitoreiras, era a vez da Marina reclamar.  —  Mãe, não quero ir pra escola. Deixa? Revirei os olhos, verdades precisam ser ditas; menina desalmada, não vê que a escola é o refúgio para o suor aqui nesta testa envelhecida.   Mãe. Ao olhá-la, era a mãe e a avó que diziam - só o ano muda.